quarta-feira, 30 de julho de 2014

Alma gêmea



Faço parte de uma família de oito membros: pai, mãe e seis filhos dos quais sou a caçula. Nossos pais já se foram, deixando-nos um legado de virtudes. Nós procuramos seguir-lhes os passos, os ensinamentos, os bons conselhos e os bons exemplos. Nunca ouvi da boca de ambos um único palavrão. Nunca senti o peso de uma palmada, uma chinelada, ou qualquer objeto que servisse para agredir. Pode-se atribuir a isso, com certeza, o fato de nunca termos brigado entre nós, considerando o fato de sermos uma boa turminha, a obediência e o respeito sempre estiveram presentes.  Éramos todos da paz e praticávamos essa paz em família.
 Simplesmente surreal sempre foi o relacionamento entre mim e minha irmã pouco mais velha do que eu, a Graça, a minha Ira. Vivíamos juntas a ponto de chamarem-nos de par de vasos em nossa cidade. Éramos inseparáveis.
Intitulo este texto de “Alma gêmea”, referindo-me a essa minha irmã mas penso ser um equívoco, pois minha alma está longe de assemelhar-se a dela tal o seu nível de elevação espiritual. Temos o mesmo DNA, nascemos da mesma barriga com uma diferença de pouco menos de dois anos. É minha irmã, meu anjo protetor.
Quando crianças, brincávamos sempre juntas. Lembro-me de ela me carregar no colo para que eu não pisasse os espinhos do caminho entre o mar e a lagoa. Parecia a mamãe tico-tico, cuidando do enorme filhote de chupim. Era também meu escudo quando aparecia um cão, ou qualquer outro animal furioso que, por sinal, nunca se enfureciam com ela.
Mais tarde, quando nossa vila já não oferecia mais possibilidade de continuar ali os estudos, ela me esperou, sem estudar, para que fôssemos juntas para o internato, um colégio de freiras em Jaraguá do Sul. Nesse colégio, por ser tão mimada em casa, chorei durante o primeiro ano inteiro e ela a me consolar com a paciência que, acredito, ninguém mais tinha. Dormíamos no mesmo quarto, fazíamos as refeições sentadas à mesma mesa e, na sala de aula, sentávamos em carteiras lado a lado. Nos jogos, impensável não fazermos parte do mesmo time e na hora de fazer tarefas, juntas também.  É inacreditável, mas até hoje nunca tivemos sequer um desentendimento. Mérito dela, claro!
Somos tão diferentes... ela, a doçura, a meiguice, a paciência personificadas; eu, impulsiva, pouco tolerante, imediatista e ansiosa. Precisava mesmo de alguém assim como ela para apagar os incêndios que provocava ao meu passar.
A vida nos separou quando casamos. Eu fui morar em Curitiba e ela em Joinville. Nossos filhos têm idades parecidas e se dão como irmãos. Amamos, eu os dela e ela as minhas, como se fossem nossos. E o são.
Hoje, já sexagenárias, nutrimos uma pela outra o mesmo amor incondicional. Nem o tempo, nem a distância conseguiram abalar essa nossa relação.  Quando estou com minha filha mais velha, eu a chamo Ira e quando estou com a Ira, eu a chamo Juliana. Dá-se exatamente a mesma coisa com minha irmã. Chama a Tadiana, filha mais velha dela, de Sílvia e eu de Tadiana. Pode?
Acho mesmo que todas as pessoas como eu deveriam ter alguém assim por perto.  A humanidade teria se salvado de muitas calamidades.
Uma história surreal, mas totalmente verdadeira! Uma história de amor incondicional!





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