domingo, 16 de fevereiro de 2020

Sobre a importância de ser grato




Na minha família de origem somos seis irmãos. Desses, os três primeiros constituem a primeira etapa. Duas mulheres e um homem, denominados os três mais velhos. Houve então um intervalo de quatro anos, por conta de uma complicada debilidade física de meu pai, uma doença grave que forçou a família a vir morar na praia e que teve como consequência a necessidade de um longo período de recuperação. Recuperado, voltou à carga na produção da prole e viemos nós, os três pequenos. Um homem e duas mulheres, dos quais sou a última.
Minha irmã mais velha permaneceu em Joinville morando com a avó Isabel. A segunda, a Suely, será a personagem principal desta história que hoje escrevo. Ela, de vez em quando, dispara pérolas de suas lembranças, como a conversa com a nossa avó Antonica, quando essa lhe revelou que a propriedade da família Moura ia até onde hoje é mar e que a laje de pedras que se pode avistar, no mar, longe da praia, nesse tempo ficava bem pertinho. Achei bem interessante essa informação. Imagino que até haveria condições de brincar por lá. Muito bom! E outras tantas lembranças que merecerão um texto só para elas.
Neste momento quero me reportar a uma revelação feita sem intenção de provocar nenhum sentimento mais intenso, mas me leva às lágrimas toda vez que me vem ao consciente.
Contou a Suely: Entrava o ano de 1950 e minha mãe se via envolvida com os preparativos para a chegada do seu sexto bebê. Paralelo a isso, a Tute, como carinhosamente chamamos a Suely, enfrentava problemas de saúde frequentes no tempo em que estudava no grupo escolar em Barra Velha, a ponto de a professora d. Belinha, que provavelmente enxergava muito mais do que seus olhos lhe mostravam, aconselhou meus pais a tirarem-na da escola. Para não ficar sem estudos, lá foi ela estudar em Joinville, no colégio Conselheiro Mafra, morando com a avó Isabel. Tanto d. Belinha tinha razão que minha irmã sempre se destacou nos estudos por lá. Prêmios e homenagens durante todo o ano.
Chegou o final do ano letivo. Tute foi sagrada a melhor aluna de todo o colégio. Haveria uma festa no dia seguinte para entrega de prêmios aos destaques do ano e ela receberia dois prêmios, mas não pode comparecer. A avó Isabel foi quem a representou e recebeu os prêmios. Meu pai chegara de Barra Velha com a missão de levá-la de volta para casa, pois minha mãe, cheia de afazeres com costuras que fazia para ajudar no orçamento da casa, precisava dela para ajudar com os três menores. E a Tute passou a ser a nossa IRMÃE.
Nunca vou conseguir vestir com palavras a imensa gratidão que tenho por essa criatura tão especial. Se não tivesse vindo mais um bebê, minha irmã teria dado continuidade aos seus estudos tão promissores. Esse bebê empecilho sou eu.
Aquela que passou por momentos de Gata Borralheira e Polyana, aos oitenta anos, a mais longeva da família, aí está a zelar pelo marido, filhas, netos e bisneta.
Minha alma não teria paz enquanto eu não registrasse o meu mais profundo agradecimento para essa criatura tão especial.
MUITO OBRIGADA, MINHA IRMÃE!



segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Transmitir conhecimento - uma questão de genética


               

Era uma tarde de clima agradável quando resolvemos, minhas irmãs Graça, Suely e eu, fazer uma visita ao senhor Moacyr Borba que, aos 93 anos, ainda detém uma memória invejável. Parece visualizar cada acontecimento relatado. Momentos muito agradáveis passamos na sua companhia.
Essa visita veio a confirmar algo de que tínhamos desconfiança, mas não certeza. A vocação para os misteres do magistério, esse verdadeiro sacerdócio, tão presente em tantos membros da família, especialmente o tronco Moura, tem seu início em tempos remotos de nossa ancestralidade.
Relatou-nos o senhor Moacyr que, em algum período do século XIX, era professor em Barra Velha, o primeiro do local, o senhor Manoel da Silva Quadros, avô do senhor Jânio da Silva Quadros, personagem da história de nosso país por ter sido um de seus presidentes no início dos anos 1960.
Houve por bem que esse ilustre cidadão de nossa comunidade fosse convocado para exercer a Exatoria do município de Parati, mais tarde denominada, Araquari. Nesse momento, entra em ação a primeira professora da família de quem se tem notícia, também a primeira professora destas paragens de Barra Velha. A partir daí nem tenho condições de quantificar o número de professores na família, muitas vezes nem o sendo por formação, mas por paixão ou apelo do sangue.
Com a convocação do senhor Manoel da Silva Quadros para a função de Coletor em Araquari, foi nomeada pela Província de Florianópolis, ninguém menos do que minha avó, Antônia Higina da Graça Moura para o substituir na função de professora formada, advinda de São Francisco do Sul.
Não era sem orgulho que meu pai nos relatava a lembrança de ver a sua mãe saindo a cavalo para exercer sua tarefa de educadora. Sentada na cela, de lado, a saia cobrindo boa parte do animal. Essa cena parece se materializar em minha mente.
A escola situava-se na, hoje, praia da Península, entre o mar e a lagoa. Pelo menos uma das filhas da minha vovó Antonica também exerceu o magistério por aqui. Meu pai sempre foi envolvido com as coisas da educação em Barra Velha enquanto estudávamos na antiga Escola Reunida Pedro Paulo Philipi.
Anos mais tarde, minha avó foi homenageada pelo município. Foi dado o seu nome a uma escola, na localidade de nome Pedras Brancas, bem próxima do mar. Houve uma ocasião em que o Exército e a Marinha Brasileiros executavam treinamento nas proximidades, a escola foi agraciada com farta doação de material. Livros, cadernos, mapas e até alimentos.
Meu avô, José Antônio Lopes de Moura, o popular Zé Lopinho, não era professor, mas cabe dizer que foi nomeado pelo Governo da República como supervisor das obras da ferrovia de São Francisco do Sul, que tinha por finalidade escoar a produção agrícola e fabril da região para o porto localizado ali.
Não existem registros, mas minha imaginação me conduz para a possibilidade de Antonica e Zé Lopinho terem se conhecido e se apaixonado nesse tempo. Ah... o Cupido! Trouxe-nos a vovó e Barra Velha ganhou sua primeira professora.