domingo, 28 de março de 2021

A historia de amor entre a bela caiçara e o jovem burguês


 

Essa bucólica historinha é baseada em fatos reais. Ela me foi contada por alguém, cuja identidade a minha memória teima em esconder. Vou vesti-la com trajes românticos, mas todos sabemos que a realidade nem sempre corresponde aos nossos sonhos e fantasias.

Eles formavam o casal mais improvável da pacata cidade. Ele, membro de aristocrática família recém vinda de Portugal, cujo patriarca ocupava cargo importante na diplomacia política da época. Um jovem que, como em qualquer família burguesa, vinha sendo educado para seguir uma carreira brilhante, fazer um “bom” casamento e ter uma vida normal, de acordo com os costumes e padrões da alta sociedade local. Aliás, ainda é assim em qualquer sociedade atual. Acontece que, ter uma vida normal, não estava nos planos do nosso personagem. Ele era considerado a alma livre da família.

Ela, uma caiçara, com ascendência muito próxima dos indígenas que por ali viviam desde tempos imemoriais, os donos da terra. Dela, pouco ou nada se sabe. Infelizmente. A única informação que se tem dela: era uma índia! Muito embora hoje saibamos tratar-se de um ser humano ímpar, dona de um coração capaz de grandes obras, de belíssimas atitudes.

E o jovem burguês, em busca de aventuras, conheceu a bela caiçara e os dois envolveram-se em um romance inconsequente. Apaixonaram-se e já faziam planos de uma vida a dois, logo desencorajados pela família dele. Toda a luta foi vã. Não o levaram a sério.

Não demorou muito para que a bela caiçara anunciasse a vinda de um herdeiro. E agora? O que fazer? Sem nenhum apoio da família, resolveram embarcar para o sul, onde tinham conhecidos que moravam em Joinville, para tentar iniciar a vida a dois, quase três.

Assim planejaram, assim fizeram. O casal embarcou em um barco a vapor e rumou para onde acreditavam encontrar seu futuro e sua felicidade. A cidade de Joinville, em Santa Catarina.

Chegaram ao Porto de São Francisco do Sul e entraram, pela Baía da Babitonga, na Lagoa de Saguassu. Desta rumaram, pelo rio Cachoeira, até o porto do Bucarein. Estavam em Joinville. Cabe aqui salientar o desconforto sofrido por nossa personagem nessa viagem tão difícil, em plena primeira gestação, inexperiente e sem orientação

Afinal, foram bem recebidos pelos amigos, moradores do local e acabaram ficando na cidade por algum tempo. Cerca de três anos. Vivia-se, nesse tempo, o ano de 1917. O jovem burguês obrigou-se a arranjar um trabalho, pois a chegada de seu primogênito era iminente. Exerceu o ofício de padeiro. Em outubro nasce o bebê. Uma menina! Não demorou quase nada, talvez uns dois anos e outra menina veio a nascer.

A família aumentando, junto com ela os compromissos e a responsabilidade. O casal decidiu então voltar para a cidade de onde haviam saído anos antes. Ali estavam suas raízes, quem sabe apareceriam melhores oportunidades para criar suas filhas.

Ali nasceram mais uma menina, a terceira filha, e o único filho homem do casal. Era o amor multiplicado por quatro. Família grande, resolveram tentar a sorte na capital. Mudaram-se todos para São Paulo. Aí nasceu a quarta filha. O improvável casal e seus cinco filhos.

A bela caiçara cuidou e amou seu jovem burguês até que a morte o levou. Um amor puro e forte os uniu a ponto de vencerem a barreira do preconceito logo no início de sua união, assim como todos os outros obstáculos que a vida lhes apresentou.

Havia entre eles um amor tão intenso que, passados apenas trinta dias da partida de seu escolhido, ela o acompanhou para, na eternidade, darem continuidade àquela história bucólica do amor entre a bela caiçara e o jovem burguês. O Senhor os abençoa e os ampara a eles e aos filhos, agora todos juntos no ambiente indescritível onde, por certo, devem estar.

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