Morávamos em um espaçoso bangalô de madeira com quatro
quartos construído em um terreno de pouco mais de setecentos metros quadrados.
Ali, nesse espaço exíguo, tínhamos tudo o que uma pequena chácara pode conter.
A trinta metros para leste ficava a lagoa de Barra Velha. Mais alguns metros e
lá estava o mar. Ah... o mar!...
Um prolongamento na parte de trás da casa, abrigava
banheiro, lavanderia e mais tudo o que não podia estar no interior da casa. Um
depósito de trecos importantes e necessários para uma ocasião de serventia. Isto
é: tudo o que se possa imaginar.
Havia grandes gramados nos dois lados da casa. Ao abrir a janela do nosso quarto, meu, da
minha irmã e do meu irmão, que ficava voltado para o lado do mar,
deparávamo-nos com um desses gramados, onde havia uma rede. Esse era o local em
que minha irmã e eu gostávamos de ficar ora balançando na rede, ora deitadas de
costas na grama observando as nuvens. “Vai desaparecer... vai desparecer... vai
desaparecer...”, repetíamos, e lá se iam elas povoar o imaginário de outras
crianças em outro lugar longínquo. E, ainda apreciando as nuvens, encontrávamos
muitos personagens que, por certo, moravam por aquelas bandas. Eram cães, cavalos,
peixes e tantos outros os quais nossa visão infantil aguçada nos permitia
descobrir. Era ali que fazíamos o lanche da tarde, que tomávamos a deliciosa
limonada, feita com os limões colhidos em nosso quintal.
No outro lado da casa havia outro verdejante gramado. Um razoável
espaço em frente a ele era reservado para o jardim da minha mãe. Ela desenhava
os canteiros e contava com a ajuda de um menino contratado para a execução de
seu arrojado projeto. Mudava várias vezes ao longo do ano, de acordo com as
flores de cada estação. As pessoas que passavam pela rua paravam para apreciar
a beleza do jardim tão bem cuidado e com tanto bom gosto. Ficava mesmo
maravilhoso. Esse gramado tinha tripla finalidade. Estender as roupas para
secar num varal construído sobre ele, colocar as roupas mais encardidas na
grama para que o sol as alvejasse e, quando já éramos maiores, virava nossa
quadra de vôlei.
Nos fundos do quintal ficava a horta. Eram várias leiras
organizadas pela minha mãe e seu ajudante, onde ela cultivava toda sorte de
verduras e legumes. Meu pai se encarregava de não deixar faltar muita terra
fértil e insumos para que tivéssemos uma alimentação saudável. Foi nesse lugar
que minha irmã Graça e eu estávamos brincando de acertar com pedras a cerca da
vizinha, a frau Salfer. De repente, um pintinho que estava ali, no lugar
errado, na hora errada, rodopiou e caiu sem vida! Falei: - Guria! Tu mataste o
pintinho! E ela: - Não! Deu um “ar” nele! Pode ver a marca da pedra que eu
atirei aqui na cerca! Nunca irei saber o que, ou quem tirou a vida daquele
pobre animalzinho que, rebelde, fugira de sua mãe. Até hoje lembramos essa
história e nos colocamos a dar risadas.
Entre o prolongamento da casa e a horta ainda havia uma
enorme árvore frondosa. Linda! Ao lado, mais tarde, foi construída a garagem,
sacrificando boa parte do galinheiro que ficava também nos fundos do quintal,
mas na extremidade oeste. Minha casa, a casa da minha infância, era um mini
zoológico, dada a quantidade de animais que criávamos. Essa era tarefa do meu
pai. Ele gostava de caçar então tinha um bom cachorro de caça e outros menores
para ajudar na captura. Um de seus cães, o Patusco, foi morto, atropelado por
um avião. Explico. O senhor Alonso Braga, um fazendeiro do sul de São Paulo,
tinha casa de veraneio no centro da vila e uma propriedade mais afastada onde
criava bois zebu. Pois bem. Esse fazendeiro tinha um filho aviador que
aterrissava seu teco-teco em plena faixa de areia da praia, bem em frente à
casa de seu pai. Na época, a faixa de areia era bem extensa e firme. Em um
momento desses, meu pai passava por ali com Patusco, que correu a latir para
aquele estranho objeto, quando o trem de pouso bateu violentamente em sua
cabeça. Lamentável!
Com esse trágico episódio interrompo aqui essa narrativa,
pois ela já atingiu um tamanho máximo para não cansar meus leitores. No entanto
há ainda muito o que registrar sobre o que vejo nessa janela recém-aberta pela
minha memória.
Irei retomá-lo em outro momento, antes que que ela se feche.
Direi apenas,
Continua...
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