domingo, 31 de agosto de 2014

Emoção e poesia




Existem fatos da minha vida profissional que me ficaram marcados para sempre. Pretendo relatar alguns aqui. Foram momentos vividos com muita emoção.
Eu dava aulas de Língua Portuguesa para jovens adolescentes e, de quando em vez, cada um deles escolhia um tema de seu agrado, estudava, preparava-se e na data marcada apresentava-o para a professora e seus colegas de classe. Minha única exigência era que o assunto fosse atual e relevante para que todos pudessem aproveitar e aprender um pouco mais. Para isso, a dicção precisava ser clara, a postura impecável e o aluno mestre deveria estar com seu tema totalmente dominado. Como eu aprendia nessas aulas! Sentava-me em um dos lugares dos alunos e bebia conhecimento .
Com os maiores, de catorze e quinze anos, lá pelo final do ano eu propunha, para avaliar sua expressão oral, um recital de textos poéticos. Meu objetivo, entre tantos, era fazer com que, principalmente os meninos, pudessem se voltar mais para as coisas da emoção. Havia o prazo para a escolha e memorização do texto, preparação e posterior apresentação. O alvoroço nesse processo de criteriosa escolha, o envolvimento e troca de opiniões dava as cores do que viria como resultado.
Aquela aluna, sempre tão impulsiva e questionadora, surpreendeu recitando Vinícius de Moraes, Soneto de fidelidade. E atacou: De tudo ao meu amor serei atento... sublime, linda, comovida, outra pessoa! Lágrimas apontam em meus olhos ao lembrar. Atualmente essa menina é advogada, como era de se esperar pela sua postura. Não tenho dúvidas de seu sucesso profissional e também da sua felicidade pessoal, se der asas àquela sensibilidade demonstrada ao recitar Vinícius.
Aquele outro, sério, compenetrado, avesso a sentimentalismos, resistiu bastante para executar o trabalho. Por fim aquiesceu e escolheu um texto que falava de despedida, uma vez que estava de mudança marcada para a Espanha no final daquele ano. Recitaria para sua namorada da época. Dei um jeito para que ela estivesse presente naquela apresentação. O menino postou-se à frente da turma, visivelmente emocionado. Começou a recitar o poema escolhido e, já na primeira estrofe, sua voz começou a ficar embargada. Recitou a segunda estrofe chorando e levou as mãos ao rosto aos prantos. Não conseguiu concluir. A emoção não permitiu. Nós, plateia, derramamos todas as lágrimas do mundo. Nos dias que se seguiram ele se inscreveu em um ateliê de literatura para escrever um livro sobre o amor na adolescência. Atualmente, depois de encontros e desencontros, a força do amor foi mais forte e os dois finalmente estão juntos e apaixonados.
Sinto-me uma pessoa privilegiada e feliz por ter vivenciado esses e tantos outros momentos marcantes com meus amados alunos. Hoje revivo tudo isso na lembrança e perpetuo a felicidade vivida então.

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